OITAVA EDIÇÃO | Perspectivas Econômicas Pós-Pandemia

Uma leitura do momento atual

Zeina Latif começa falando que realmente tivemos uma recuperação em V, estimulada por uma injeção de recursos públicos na economia. Nessa toada, ela complementa afirmando que, em sua opinião, fica muito claro que houve um erro de política econômica, especialmente na calibragem de incentivos fiscais. “É um engano pensar que o aumento da inflação que estamos vivendo é apenas fruto de disrupção da cadeia de valor. É muito claro que temos também reflexos de questões fiscais.”. Além do mais, em um país com tanta demanda reprimida, quando o consumo é estimulado a reação é muito rápida. Ela ainda finaliza dizendo que neste cenário, somado ainda a questões estruturais e a incertezas políticas, não dá para acharmos que teremos crescimento do PIB acima de 1% neste ano.

Termômetro da ponte entre intenção e execução dos investimentos

Flavio Souza aponta que hoje passamos por uma transformação muito relevante no mercado financeiro. Alavancada pela aprovação do teto de gastos em 2016, hoje a taxa de juros alcançou patamares que até então não tínhamos experimentado no Brasil. Talvez até em níveis exagerados, segundo ele. Isso é perceptível pelo aumento do número de IPOs e outras transações, por exemplo. Um ano recorde, mesmo diante de um palco protagonizado por uma pandemia. “Naturalmente, isso é muito saudável. Este alargamento de transações é um termômetro. Na prática, tenho percebido que essas transformações que vemos acontecendo são mudanças estruturais que vieram para ficar.”.

Uma outra ponte, agora na ponta dos empresários e executivos

João Marcio contribui sob a perspectiva de alguém que atua em uma indústria que reflete muito qualquer tipo de oscilação e conjunturas. Na medida em que lida diretamente com o mercado de trabalho, ele percebe, por exemplo, que hoje há um menor percentual de vagas para C-level em comparação ao período pré-pandemia. Isso é reflexo também de indicadores macroeconômicos, como PIB. Na mesma medida em que as vagas do topo da pirâmide tendem a se retrair em cenários de instabilidade econômica, ao primeiro sinal de retomada, os processos seletivos de níveis executivos retornam ao jogo. Sinal de que para voltar aos patamares de crescimento, quem comanda a empresa precisa estar a postos.

Aos trancos e barrancos, os passos para frente vão se firmando

Flavio Souza expõe que, sempre aos trancos e barrancos e com muitos desafios, no Brasil estamos acostumados a lidar com volatilidades. Temos um setor empresarial muito competente e criativo, que encontra seu caminho. Gostaríamos de ver mudanças estruturais, mais definitivas e mais ágeis. Mas de um modo geral, com o passar do tempo nossa economia se torna competitiva em diversos setores. Vejo sinais de que damos passos a frente, que serão preservados.

Custo Brasil e suas consequências

Zeina disse que o tal custo Brasil, que engloba tantas coisas, gera a tendência à concentração da economia. É necessário ter escala de produção para sobreviver a este custo. Caso contrário, a não ser que lide com um nicho muito específico, é muito difícil para as empresas sobreviverem. Com a concorrência de importados então, aí o cenário fica mais desfavorável ainda. Se o custo Brasil existe e toma tais proporções, é em partes porque erramos muito em políticas públicas. A pandemia exacerba este movimento. Ou seja, empresas que já estavam em posições de suportar os desafios impostos pelo custo Brasil passam a exercer dominância ainda maior, na medida em que investiram ainda mais pesado, por exemplo – e principalmente – em tecnologia. De acordo com ela, todo este contexto evidencia a urgência de reformas políticas e econômicas, uma vez que hoje no Brasil há um abismo entre os negócios que conseguem se manter diante das tempestades mais intensas e aqueles que são devastados ao menor sinal de vento.

Reagindo mais do que planejando

João Marcio fala sobre a crise econômica decorrente da pandemia, e seus reflexos. Fato é que  vivemos altas taxas de desemprego – ainda. E com altíssima volatilidade e incertezas. “A volatilidade é tamanha que hoje digo que minha maior dificuldade é conseguir construir cenários”, ele afirma. No início da pandemia, a agenda de curto prazo era caixa. Hoje, por mais que as nuvens estejam mais esparsas, os empresários estão mais reagindo do que qualquer outra coisa, e fica difícil pensar em longo prazo neste contexto. “Nossa indústria de recrutamento e seleção é diretamente impactada por PIB”.

Crise cíclica clássica ou essa tem um quê de diferente?

Apesar de esta crise ser marcada por um elemento exógeno, Zeina defende que não acha que seja motivo para partimos 100% para níveis experimentais ao lidar com as consequências da pandemia. Claro: saúde se sobrepôs a tudo no olho do furacão. Do ponto de vista de política macroeconômica, não podemos rasgar manuais de economia e deixar total à mercê de experimentalismos. Principalmente quando o assunto é economia emergente, onde a correção de erros é muito mais dolorosa.

O que é risco hoje para o empresário brasileiro?

Risco é o próprio Brasil, de acordo com João Marcio. “Meu desejo é que um dia paremos de pronunciar a palavra ‘crise’. E crise é aquela situação em que o velho ainda não morreu e o novo ainda não nasceu”. Crises impõem agendas de risco permanentes. Para o empresário brasileiro, o risco hoje perpassa por instabilidade e perenidade. Ele afirma que precisamos ter segurança e confiança de que oscilações constantes não seguirão perturbando a condução dos negócios. Mas, apesar do Brasil, é preciso tirar o chapéu para o empresário brasileiro, que se inova a cada dia, e está conseguindo sair mais forte do outro lado. Flavio Souza soma ainda dizendo que 2022 deverá ser um ano de travessia, para que possamos olhar para os anos futuros com um pouco mais de previsibilidade.

O que podemos tirar de positivo dessa pandemia?

Zeina aponta que um fator positivo é a capacidade de adaptação do setor privado. Ainda que seja restrito a grandes empresas, mas de uma forma geral todos nós nos adaptamos em certa medida. “O que o Estado precisa é parar de atrapalhar”, ela defende. Outra coisa que ela enxerga: temos muitas lideranças políticas interessantes no Brasil que conseguiram conduzir com maestria este momento de crise, e nada como concorrência para fortalecer a democracia. Um bom exemplo disso é a própria questão da vacina, de acordo com ela.


Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *